Dicas: Melhores filmes nacionais adaptados de obras literárias

18 de abril de 2022
Confira as dicas do Fábio para maratonar os melhores filmes nacionais adaptados de obras literárias.
Tempo médio de leitura: 6 minutos.

 

– Ah, o livro é bem melhor que o filme…

– Eu li o livro e achei muito ruim o filme

– Os produtores conseguiram distorcer o livro com essa adaptação para o cinema!

 

É muito comum escutar esses comentários por aí quando se fala sobre um filme adaptado de uma obra literária. E o que dizer sobre essas comparações?

Inspirado pela cerimônia do Oscar, e para entender melhor sobre esse assunto muitas vezes polêmico, o Positivo em Foco conversou com o professor de Língua Portuguesa e Literatura Fábio Bettes, do Curso Positivo, que elencou as 10 melhores adaptações de livros para as telonas. Antes de mais nada, vale observar um princípio fundamental: um filme não é melhor nem pior do que o livro que o inspirou. Trata-se de modalidades artísticas diferentes, cada uma com as suas devidas peculiaridades. Filme e livro: objetos artísticos absolutamente distintos.

Dito isso, vamos às dicas!

1 – O pagador de promessas (1962) – O dramaturgo Dias Gomes atingiu a perfeição nesta peça, no sentido de que conseguiu ser simples, direto e absolutamente contundente. A história de Zé-do-Burro, que apenas quer pagar uma promessa feita, mas que acaba sendo morto ao final (ah, o spoiler…), encenada pela primeira vez em 1960, foi adaptada magistralmente para o cinema por Anselmo Duarte e recebeu a maior premiação conquistada por um filme nacional até hoje: a Palma de Ouro do Festival de Cannes, em 1962. Qualquer estudioso do cinema brasileiro lista este filme entre os cinco, dez mais importantes de nosso cinema nacional

2 – Vidas secas (1963) – Uma das obras literárias mais importantes do Regionalismo de 1930 e da Literatura Brasileira, publicada em 1938 pelo velho Graça ou, como é mais conhecido, Graciliano Ramos. Dirigido por Nelson Pereira dos Santos, um de nossos melhores diretores de todos os tempos. Em preto e branco, o filme retrata muito bem a falta de cores, água e perspectivas para Fabiano e tantos outros retirantes nordestinos como ele.

3 – Macunaíma (1969) – Publicada em 1928 por Mário de Andrade, esta obra é considerada a grande produção literária do Modernismo brasileiro da década de 1920. O diretor Joaquim Pedro de Andrade conseguiu captar a essência da obra de Mário e repassá-la de modo original às telas. As sequências chegam a possuir pinceladas surreais, nas quais Macunaíma, o protagonista e herói sem nenhum caráter, é bem retratado como a fusão de todos os elementos étnicos, culturais e comportamentais dos brasileiros.

4 – Memórias do cárcere (1984) – Em 1953, Graciliano Ramos publicou essa obra, contando o tempo em que passou na prisão como prisioneiro político durante o governo Getúlio Vargas, no ano de 1936. Ainda que de forma sucinta, o filme retrata bem o sofrimento não só do autor-narrador, mas de tantos outros presos durante o governo Getúlio Vargas.

5 – O que é isso, companheiro? (1997) – Em 1979, voltando do exílio, Fernando Gabeira resolve contar um pouco de sua experiência naqueles turbulentos anos na virada dos 1960 para os 1970, quando governo militar e militantes de esquerda partiram para um enfrentamento mais violento. O livro procura mostrar muito mais todo o contexto de aumento das tensões, redundando na luta armada. Já o filme praticamente se ateve a um fato maior: o sequestro do embaixador norte-americano, pois era o mote para um filme de ação. Escolha muito feliz do diretor Bruno Barreto, que fez uma ótima adaptação da obra.

6 – Um copo de cólera (1999) – Raduan Nassar, um dos melhores e mais emblemáticos escritores de nossa literatura contemporânea, escreveu apenas duas obras, nos anos 1970, além de poucos contos. Depois, aposentou-se. No entanto, o que escreveu foi absolutamente definitivo, genial mesmo. E o diretor Aluizio Abranches conseguiu fazer uma adaptação cinematográfica também genial, respeitando e muito a linguagem de Raduan.

7 – Lavoura arcaica (2001) – Novamente, uma adaptação da obra de Raduan Nassar; agora, sob a direção de Luiz Fernando Carvalho. Uma obra mais complexa que “Um copo de cólera”; logo, um desafio ainda maior de uma adaptação para o cinema. E mais: o autor autorizou a adaptação desde que respeitassem a literariedade do texto. A princípio, fortes chances de o filme ser um fracasso. Qual o resultado final? Um dos filmes brasileiros de maior qualidade artística. Trilha sonora impecável, ótimas performances dos atores, captações muito diferentes das câmeras de vídeo, a fotografia espetacular… Resumindo: um filme fantástico. Há um escancarar da alma humana mesmo, sobretudo em relações familiares bem problemáticas, numa releitura trágica da parábola do filho pródigo.

8 – Cidade de Deus (2002) – Em 1997, Paulo Lins lança o romance “Cidade de Deus”. Inspirado em fatos reais, o enredo conta a evolução da trajetória da criminalidade no Rio de Janeiro, em especial, na localidade chamada Cidade de Deus, comunidade enfocada desde a sua origem, nos anos 1950, até o início dos anos 1980. O que mudou, ao longo desse período? A criminalidade, que foi aumentando, assim como o calibre das armas empregadas. A criminalidade que crescia à margem da presença do estado. Um romance bem extenso, originalmente com mais de 600 páginas. O diretor, Fernando Meirelles, trouxe uma adaptação brilhante do livro, conseguindo fazer uma seleção inteligentíssima dos melhores trechos, numa montagem excepcional, violenta, engraçada em certos pontos e tensa. O público adorou (até hoje um dos maiores sucessos de bilheteria), a crítica também e Fernando Meirelles obteve destaque internacional, dirigindo filmes em outros países.

9 – Capitães da areia (2011) – Em 1937, o baiano Jorge Amado, até hoje um de nossos maiores fenômenos editoriais, publica “Capitães da areia”, uma obra com temática urbana, tendo Salvador como cenário. Ainda que de modo um pouco idealizado, romântico mesmo, o autor aborda uma temática sensível até hoje: os menores de idade vivendo na rua, em situação de vulnerabilidade, fazendo de tudo para poderem sobreviver e, invariavelmente, abraçando a criminalidade. Cecília Amado, neta de Jorge Amado, fez uma adaptação que não chega a ser brilhante, mas bastante sensível da obra, conseguindo caracterizar bem os personagens e os seus dramas.

10 – A hora e a vez de Augusto Matraga (2015) – Guimarães Rosa, consagrado como um de nossos maiores escritores de todos os tempos, fez sua estreia literária em 1946 com o livro de novelas (contos) intitulado “Sagarana”. A narrativa que fecha a obra é exatamente “A hora e a vez de Augusto Matraga”. Se já é difícil traduzir Guimarães para outros idiomas, por conta de sua linguagem personalíssima, imagine adaptá-lo para as telas de cinema. O diretor Vinícius Coimbra aceitou o desafio e fez bonito: ótima adaptação, que conseguiu harmonizar a linguagem artística do prosador mineiro com muito drama e muita ação, agradando ao público e à crítica.

E aí? Gostou das dicas? Concordou ou discordou das análises? Bem, o melhor a fazer é ler os livros e ver os filmes, levando essas dicas como uma provocação ou um estímulo.

Boa degustação!


Fábio Bettes, professor de Língua Portuguesa e Literatura do Curso Positivo, onde leciona desde 2002. Também autor de livros didáticos.

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